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domingo, 21 de fevereiro de 2010

A Lucidez Perigosa


Estou sentindo uma clareza tão grande
que me anula como pessoa atual e comum:
é uma lucidez vazia, como explicar?
Assim como um cálculo matemático perfeito
do qual, no entanto, não se precise.
Estou por assim dizer
vendo claramente o vazio.
E nem entendo aquilo que entendo:
pois estou infinitamente maior que eu mesma,
e não me alcanço.
Além do que:
que faço dessa lucidez?
Sei também que esta minha lucidez
pode-se tornar o inferno humano
- já me aconteceu antes.
Pois sei que
- em termos de nossa diária
e permanente acomodação
resignada à irrealidade -
essa clareza de realidade
é um risco.
Apagai, pois, minha flama, Deus,
porque ela não me serve para viver os dias.
Ajudai-me a de novo consistir
dos modos possíveis.
Eu consisto,
eu consisto,
amém.

Clarice Lispector

3 comentários:

busquesantidade disse...

Interessante que tudo o que um ser humano pode almejar de melhor, é a lucidez, o equilíbrio, palavras quase sinônimas a meu ver. Ser lúcido é ver as coisas com transparência, sem sombras de dúvidas, isto deve ser simplesmente fantástico. Quereria viver isto e assim.Na verdade almejo somente isto. Abraço. Lourdes.

jakeline magna disse...

Adoreiiii o blog... ja sou seguidora fiel vai ter que me aturar sempre em seus comentários... rsrs

Unknown disse...

Linda oração!

Tal clareza nos anula, não porque vamos nos perder nela, mas porque perdemos a razão de dizer o que achamos ser, no fim, só seremos o que realmente somos.

Como diz o poema bíblico.

E conhecereis a verdade e ela libertará.

Paz e bem

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